Procurador da República desabafa e diz que em 14 anos no RN trabalhando na área de combate a crimes do colarinho branco “os resultados foram pífios”
fevereiro 24, 2023Em janeiro o procurador-geral da República, Augusto Aras, assinou portaria removendo a pedido o procurador da República, Rodrigo Telles de Souza, do Rio Grande do Norte para o Ceará.
Durante o período de carnaval, Rodrigo Telles fez uma postagem no Instagram em forma de desabafo. Confira:
“No começo do ano fui transferido de Natal para Fortaleza, minha cidade de origem. Passei 14 anos no RN, sempre trabalhando na área de combate a crimes do colarinho branco.
Os resultados foram pífios. A primeira investigação mais complexa em que atuei (Operação Testamento, sobre grupos de doleiros) teve início em 2008. Somente 15 anos depois os processos terminaram, e apenas dois envolvidos cumprem pena, com uso de tornozeleira eletrônica. Outro caso ilustrativo, iniciado em 2011, tratou de corrupção (Operação Pecado Capital). Houve a propositura de cerca de 110 ações penais e de improbidade administrativa. Mais de 10 anos depois, só uma chegou ao fim com condenação e suspensão dos direitos políticos do parlamentar estadual beneficiário do esquema. Foi possível recuperar apenas 10% dos recursos públicos desviados. Isso é muito pouco. Casos posteriores seguem a mesma tendência.
No CE, trabalharei na mesma área, na qual quem tem conexões jurídicas, políticas, econômicas ou sociais consegue se livrar de punição, o que não é novidade. Nesse país, os que de algum modo batalham contra desigualdades travam uma luta inglória.
Então, em Fortaleza, minha expectativa é continuar perdendo. A propósito, é muito esclarecedor um trecho de entrevista recente do padre Júlio Lancelotti (vou tentar colocar o link nos comentários).
Essa situação não me faz perder o ânimo. Trouxe para a minha sala de trabalho daqui um quadro com uma representação de Dom Quixote (segunda foto) que me lembra uma das músicas dos Engenheiros do Hawaii: “Muito prazer, me chamam de otário/Por amor às causas perdidas”. A mesma banda, em outra canção, explica por que pessoas assim geralmente são incompreendidas: “Seria mais fácil fazer como todo mundo faz/O caminho mais curto, produto que rende mais/(…) Mas nós vibramos em outra frequência”.
Uma das belezas do ser humano é a capacidade de levantar a cabeça e continuar em meio a dificuldades. Então, sigamos com perseverança. Não à toa essa palavra rima com esperança. Cazuza, que entendeu o Brasil melhor que ninguém, já cantava: “Mas se você achar/Que eu tô derrotado/Saiba que ainda estão rolando os dados/Porque o tempo, o tempo não para”.
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